quinta-feira, 23 de abril de 2015

Compreendendo Cras - Parte II

Por

ROZANA FONSECA



Bom, após análise de quase 90 postagens nos perfis das unidades CRAS e SCFV, concluo que aqueles que sabem pouco ou nada sobre o que é o CRAS – me refiro aos moradores do território onde o CRAS está instalado, aos comerciantes do local, aos líderes religiosos e comunitários, aos profissionais da escola, aos agentes comunitários de saúde, equipes de saúde e os profissionais de outras redes que moram longe, mas que acessam o facebook e acompanham as postagens – poderão ter as  seguintes ideias sobre a função dessa unidade:
  • Local que oferece diversos cursos, como: artesanato, manicure, culinária, fuxico, corte e costura, cabeleireiro, maquiagem, tricô e crochê, informática, panificação, confecção de enxoval de bebê, pintura em tela (todos estes cursos foram citados nas postagens que analisei – Artesanato foi divulgado pela maioria;
  • Local de festas – comemorações para todas as datas com brinquedos infláveis e caracterizações.
  • Local para se fazer atividades físicas como ginástica, artes marciais, dança, capoeira e etc.;
 Faz-se isso tudo, com muita dedicação, mas por que que uma das maiores queixas das equipes de CRAS continua sendo a falta de adesão das famílias nas ações que supostamente é o PAIF? Porque isso é velho! Isso é a continuidade de uma assistência social pontual e meramente assistencialista e resultado dos trabalhos sociais realizados por ONGs e instituições muito antes de existir a PNAS e o SUAS. A maioria dos trabalhadores neste período tinha formação de nível fundamental ou médio – claro que algumas contavam com profissionais de nível superior, mas nem se compara com o número de hoje. Portanto, quem realizava essas ações eram pessoas com boa vontade e que queriam mobilizar a comunidade para promover atividades com intuito de romper a ociosidade das crianças, adolescentes e idosos.
Qual a diferença com os CRAS de hoje?
 Considerando a regulamentação da política de assistência social e a criação do SUAS, trago como principal diferença os executores dessa política. Temos uma NOB-RH que regulamenta quais os profissionais de nível superior irão compor as equipes de referência e a coordenação, os quais são responsáveis por materializar a proteção social no âmbito da seguridade social – obviamente que são responsáveis junto com a gestão. Mas fomos “chamados” para reproduzir o velho? Eu não acredito nisso, assim como muitos que estão trabalhando segundo as diretrizes, princípios e objetivos dessa política, pautados num posicionamento ético-político que falamos no texto I – posicionamento fundamental, uma vez que operacionalizar uma política pública não se trata de seguir manuais.
 Voltando ao que é publicizado como ação dos CRAS, estamos em grande desvantagem, porque não fomos ainda capazes de desfazer mitos e nos debruçar em ações muito árduas. Não deveríamos fazer diferente com DIFERENÇA, já que o trabalho social passa a ser desenvolvido pautado no conhecimento teórico, técnico e metodológico?.
 Este trabalho “técnico” e muito árduo, não se materializa como essas atividades citadas acima que funcionam como um engodo, ludibriando e criando ilusão de que trarão resultados significativos. Qual a capacidade transformadora de um certificado de manicure oferecido pelo CRAS? Este, ao transvestir ou potencializar suas ações em matéria de formação profissional ou geração de renda, reforça a inclusão perversa – a culpabilização da família pela sua condição socioeconômica também permeia essas atividades.
 O CRAS, não sendo “casa de cursos profissionalizantes, mas atuando como se fosse e desenvolvendo ações de suposta geração de renda”, cria nos indivíduos e nas famílias uma expectativas de inclusão no mercado de trabalho e de mudança da condição econômica da família. Isso não vai acontecer! (Pelo menos em escala relevante). Será mais uma frusrtação e mais uma “razão” para continuar desacreditando em si e nas políticas públicas.
 Esta por sua vez, atribuirá a eles a culpa pela fracasso: quantos vezes irão repetir: “nossa, a Patrícia já fez curso de culinária, cabeleireiro e bordado em pano de prato, mas continua querendo fazer mais curso e nada de arrumar um trabalho”. Provavelmente não arrumou trabalho porque o que ela faz é de baixa qualidade, tem pouca escolaridade ou o mais importante: ela ainda não foi escutada, se fosse, talvez descobririam o que ela gostaria de fazer e que teria sentido para a sua vida. Infelizmente, conhecer a demanda não significa acesso ao serviços púbicos ou privados! Mais um motivo para que nosso trabalho seja levado a sério, porque uma situação dessa não dá pra ser tratada segundo as ideias ou concepções do senso comum, correndo o risco de perpetuar a naturalização das consequências da desigualdade social.
Quando penso que o trabalho social (as ações propostas pelo PAIF) não se materializa na mesma lógica das atividades em questão, é porque os seus resultados não podem ser observados somente através de números, e não funcionam como “chamariz” para ações partidárias. Não adianta pressa! Pois não se deve marcar data para colher os frutos desse trabalho, porque ele pode aparecer na próxima década ou geração da família e se não aparece nesta instituição, ele será tão pouco observável nas tramas do território.
 Já pensaram na periodicidade decenal dos planos das políticas públicas? Sumariamente é por considerar que não se muda nada do dia para a noite e que tudo precisa ser diagnosticado, planejado e continuado – devendo acontecer de formar articulada e integrada com os demais setores públicos e privados. Não tenhamos pressa! O tempo das famílias não é o mesmo do calendário político.
 Não é para correr, mas muito menos para ficar “sentado” assistindo aos equívocos na oferta dos serviços – resistir, se posicionar por questões dessa natureza faz parte das atribuições de todo mundo. Tenhamos sabedoria e compromisso com o que estamos propondo a construir, por que quem disse que a proteção social básica não é complexa? você já parou para analisar que muitas famílias que são atendidas nos CRAS estão com os direitos humanos violados?
Finalizando, quero reforçar que este texto é referente ao que vi nas postagens no facebook e segundo o que leio ou ouço dos próprios técnicos, portanto, os CRAS onde o trabalho está acontecendo a contento, não fiquem preocupados – não estou generalizando – até porque isso seria impossível, de acordo com a pesquisa divulgada pelo IBGE, em Maio de 2014, tínhamos 7.968 CRAS pelo País e eu acompanhei as postagens de apenas 70 CRAS! Inclusive irei comentar no último Post, três postagens que gostei muito, tem muito CRAS trilhando por bons caminhos. Por isso, aproveitem para comentar aqui ou na página no facebook suas impressões e a realidade que você vivencia.

Publicação Oficial no:
https://craspsicologia.wordpress.com/2015/04/22/parte-ii-o-que-e-o-cras-segundo-o-facebook/



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